MODA | SOCIAL | 16 de Setembro 2021 | Júlia Duvoisin
Collab com a ONG Círculos de Hospitalidade promove encontro familiar de refugiados do Oriente Médio
Já imaginou abraçar seus filhos somente em pensamento?
Um dos maiores desafios do mundo na atualidade é a crise humanitária. 1 em cada 95 pessoas são obrigadas a fugir de suas casas, abandonando suas raízes e famílias por conta de conflitos, perseguições, violência, violação de direitos humanos ou eventos que perturbam seriamente a ordem pública. Os refugiados e imigrantes compõem assim, uma nova camada da sociedade e chegam ao Brasil já em estado de precariedade econômica e social.

Roubados de seu lar, os refugiados sofrem ainda com o crescimento assustador da xenofobia e do fechamento de barreiras por países que poderiam oferecer suas terras para um recomeço, por conta de uma tendência global em retratá-los como indesejados, ameaçadores e problemáticos, amplificando assim, o seu sofrimento e despindo tais comunidades de sua humanidade e individualidade.

A ONG Círculos de Hospitalidade – localizada em Florianópolis, mas que transcende as barreiras brasileiras – nasce para desafiar tais narrativas, que hierarquizam a vida humana e promovem políticas hostis de acolhimento. Para Bruna Kadletz, presidente da organização, humanizar o nosso olhar a fim de enxergar o outro como parte de nós, mostra-se profundamente necessário:

“ Compreendemos que há necessidade de transformar nosso olhar e ressignificar nosso entendimento sobre refúgio, humanizando as biografias daqueles que são forçados a abandonarem os seus lares, a sua terra natal e as suas vidas a fim de buscarem refúgio em terras desconhecidas. Nossos projetos refletem esta visão e buscam colocar em prática os princípios que nos movem. “
Princípios esses que se tornaram inspiração para uma linda, impactante e esperançosa campanha chamada “Humanize o Seu Olhar”. Movidos por uma demanda constante da ONG, o projeto ousado foi criado: reunir famílias separadas pela Guerra e pela Violação de Direitos Humanos. Separadas não por escolha, mas por sobrevivência.
Assumindo o formato de uma camiseta, a esperança de pais e mães que deixaram seus filhos em seus países de origem para tentar buscar melhores condições de vida no Brasil, foi reacendida. Ao longo de 9 meses, em uma campanha que transgrediu fronteiras, conquistando centenas de pessoas pelo país e espalhando conscientização e hospitalidade, 3 famílias foram reunidas.



Agora é a vez de Iman.
Com muita admiração pela Organização Círculos de Hospitalidade, o Projeto Cidades Invisíveis tem orgulho de embarcar nesta jornada de sucesso, confiança e amor. Em uma Collab única e impactante, transformaremos em realidade, o sonho de uma mãe Síria de reencontrar os seus três filhos.

Dez anos após o início dos conflitos na Síria, dentro do contexto da Primavera Árabe, mais de 13,3 milhões de pessoas foram forçadas a deixar tudo para trás. Entre elas, milhares crianças que tiveram que abandonar sua infância para aprender a sobreviver à guerra. Iman e seus filhos estão nestes números.
Porém, é necessário pensar neles como indivíduos singulares, com histórias únicas e sentimentos ímpares.
Conheça agora a trajetória de Íman, em suas palavras, traduzidas do árabe.
Como era a vida antes da Guerra?
- Em Damasco, Síria, eu morava com meu marido e filhos numa região calma e tínhamos a felicidade que todos desejam. Antes da guerra, fiz curso de fisioterapia e obtive o certificado para trabalhar como fisioterapeuta. Eu planejava trabalhar e sonhava em me desenvolver profissionalmente. Queria que meus filhos estudassem e assim poderiam construir um futuro melhor. Também sonhei em estar com eles lado a lado na realização dos seus sonhos, apoiando-os nas situações de fraqueza e ajudando-os a superar os obstáculos, principalmente aqueles erguidos pela guerra.
Quais foram as consequências do conflito em sua realidade?
- O agravamento da Guerra Síria separou-me de meus filhos e tornou este sonho distante. A guerra causou muita dor, pobreza e perdas. Os custos das necessidades básicas, como água, eletricidade, comida e combustível aumentaram muito. Eu não podia mais trabalhar e meus filhos tinham dificuldades para continuar seus estudos.
Como você tomou a decisão de deixar a Síria para vir ao Brasil?
- Meu filho mais velho ia completar 18 anos, idade em que ele seria obrigado a servir ao exército sírio. Para evitar que ele fosse arrastado para uma guerra injusta, na qual irmãos matam irmãos e vizinhos matam vizinhos, nós dois fugimos em 2018 e buscamos refúgio no Brasil. Com intuito de proteger meu filho mais velho, deixei meu marido e outros três filhos na Síria, e viemos só nós dois para Florianópolis.
- Um amigo sírio nos contou que o povo brasileiro era aberto e acolhedor, e que o governo brasileiro era justo e respeitava os direitos humanos, e por essa razão escolhemos o sul do Brasil. Na época, não poderia imaginar que seria tão difícil ficar longe da minha família e que ficaríamos tanto tempo separados.
- No Brasil sinto-me segura e acredito que o meu futuro e o futuro dos meus filhos será melhor aqui. Aqui, tenho confiança que meus sonhos de uma vida e um trabalho decentes se tornarão realidade, mas o que me entristece é que meus filhos estão longe de mim e permanecem em um país inseguro, onde estão expostos a vários perigos.
Você viu seus filhos neste meio tempo?
- No final de 2020, voltei à Síria por causa da condição de saúde da minha mãe idosa. Ela estava internada no hospital em estado crítico. Foi uma viagem rápida e chegando lá, encontrei meus filhos num estado psicológico deplorável. Ainda assim, não consegui trazê-los comigo para o Brasil. Meu marido cuida deles, mas ele trabalha fora de casa o dia todo para ganhar um sustento que não é suficiente para as necessidades básicas da família. Nossos filhos acabam ficando muito tempo sozinhos e sofrem com a tristeza e a solidão.
Qual é o seu sonho?
- Tudo o que mais quero é me reunir com meus filhos, ter minha família num único local, e poder compartilhar cada momento de nossas vidas juntos. Quero vê-los crescer num ambiente saudável e sem medo dos sons de tiros, granadas e sequestros. Não desejo que eles passem por mais necessidades, sem acessar o básico da vida. Infelizmente, meus filhos moram num lugar e eu em outro. Eles dormem com lágrimas nos olhos devido ao medo constante e pedem para vir ao Brasil, a fim de se sentirem seguros ao meu lado.
- Eu também durmo com lágrimas em meus olhos de tanta saudade e tristeza. Nós nos comunicamos por WhatsApp quando o sinal da internet na Síria permite. Meu filho mais novo, de apenas 11 anos, chora muito ao ouvir minha voz. Ter meus filhos e meu marido ao meu lado é o recomeço da vida que tínhamos e sonhamos, e que perdemos por causa da Guerra Síria.

A venda da camiseta, que tem em sua estampa a forte obra “Escondendo os Olhares”, do artista e parceiro do Projeto Cidades Invisíveis, Carlos Bobi, será destinada à esta campanha.
Caminhe conosco em prol da humanidade.
Apoie a reunião familiar de refugiados e imigrantes!
Humanize o seu olhar.

Júlia Duvoisin
Estudante Jornalismo da Universidade Federal de Santa Catarina. Redatora do Projeto Cidades Invisíveis